sexta-feira, 25 de maio de 2007

grito


conflito
infinito.
consistes?
- és mito,
reflicto,
convicto.

assistes
contrito.
está dito
(mal-dito)

persistes?
medito.
existes
apenas
não-dito.

não vejo
não fito
só ouço
- aflito -
teu grito.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Valquíria


A Valquíria desceu voando junto ao Rio,
e colhe os reflexos das Flores sobre a Água
(antiga Neve derretida da Montanha).
Com eles tece um Colar de Mágoa.

As Flores aguardam ao cair da Noite
a última Brisa… e a quem vão dá-la?
À Valquíria, que saberá conduzi-la
até aos velhos Deuses do Walhalla.

A Valquíria estremece, pressentindo
ao longe, na Noite, um Canto triste.
Estremece, julgando ouvir um Eco amado
na Escuridão imensa que persiste.

Mas tem de partir… esperam-na os Deuses,
a quem jurou até ao fim servir…
Monta o Cavalo Alado e chama a Brisa
mas as Flores em pranto não a deixam partir…

Adormece a Valquíria à beira do regato
do seu cansaço as Flores roubam mais perfume…
Agita-se na Noite a Brisa ainda inquieta,
e ao longe, o Eco repete o seu queixume…

sexta-feira, 27 de abril de 2007

endereço errado ?

Wrong Address Wrong Address - Susan Hudson

Já avivámos brasas molhadas
no caudal da lágrima vã
e flutuando, a lua nos trouxe
à luz da manhã

Reencontrámos lágrimas e riso
demos tempo ao tempo veloz
já fizemos tanto e tão pouco
que há-de ser de nós

Que há-de ser da mais longa carta
que se abriu, peito alvoroçado
devolver-se-á: «endereço errado?»

Que há-de ser, só nós o sabemos
pondo o fogo e a chuva na voz
repartindo ao vento pedaços
que hão-de ser de nós

» Sérgio Godinho «

quarta-feira, 25 de abril de 2007

sexta-feira, 20 de abril de 2007

TEMPUS FUGIT


É uma infelicidade que existam poucos intervalos entre o tempo em que somos demasiado novos e o tempo em que somos demasiado velhos.

MONTESQUIEU




segunda-feira, 16 de abril de 2007

reflexos de prata

Silber Spiegel

atalp disse...

"...La maison est pour ainsi dire un contre-univers ou un univers du contre."

Sempre se pode determinar o maior ou menor espaço que delimita o canto habitável e a maior ou menor folga que define a propriedade ou o empréstimo.
De vez em quando, o momento vem de justapor a essa desocupação uma implantação radical, isto é, de fazer coincidir o exercício tranquilo da disciplina com a fervorosa inquietação disseminada-a nitidez crua com a dissolvência tépida.
A poesia é um contra universo que empequena o exterior para o conter, transformando a dissolvência do horizonte em nitidez de proximidade e de apoio.

15 de Abril de 2007


Caro Atalp

Sem dúvida o seu comentário foi o melhor que recebi neste humilde recanto, até à data.
Por isso achei por bem realçá-lo, e tomá-lo como mote para, não um poema, mas um novo Post e assim torná-lo mais visível a quem passe por este recanto.

Suponho ser a citação inicial de Simone de Beauvoir, isto por pesquisa que fiz na Net, pois não conheço a Obra dessa escritora, conheço algo da sua Vida e Filosofia, como cultura geral apenas.

Quanto à Casa de cada um, que como é evidente, pode ser a Casa física, mas em sentido mais lato poderá ser uma Casa “mental”, ou seja, por exemplo, uma prosa, um poema, um livro, qualquer obra noutro campo artístico e aqui no ambiente onde nos encontramos, um Blog.

E é essa Casa que o meu caro Comentarista refere, onde podemos, neste caso, posso eu tê-la mais ou menos ocupada não só devido à extensão de um Post ou uma tentativa poética, que poemas outras coisas serão e não me arrogo, como anteriormente me foi apontado por outro amigo algo freudiano, qualquer comparação com Goethe ou sequer com Poetas bem menores.

No entanto também a Casa pode estar pouco ocupada fisicamente, mas devido à densidade da matéria exposta, essa baixa ocupação em volume seja compensada com a densidade do assunto, ou seja, uma alta quantidade de informação pode transmitida em poucas palavras.
Isto, pois em Teoria da Informação também se define uma densidade da mesma.

Resumindo: pode dizer-se muito em poucas palavras ou nada dizer escrevendo várias páginas.

Também a propriedade da Casa (desta ou outras) nunca será apenas de quem se diz seu proprietário, pois muitas vezes o mobiliário é emprestado, dada a recorrência a palavras, obras ou ideias de outros Autores. Aliás ninguém pode ser totalmente original. As ideias de cada um provêm do caldo cultural em que esteve banhado desde que nasceu até à hora presente.

Creio ser esse o empréstimo a que se refere, mas caso eu não tenha integrado a sua ideia, terei o maior gosto em que me esclareça.

Quando utiliza a expressão “justapôr a essa desocupação” eu creio que pretende mesmo dizer “preencher essa desocupação”… tanto mais que nada se pode justapôr a um espaço vazio. A justaposição pressupõe que algo material esteja “posicionado” algures para outra entidade ontológica se lhe poder encostar (justapôr).

Chegamos então ao cerne ou conclusão do seu comentário – a poesia como um concentrador ou redutor do universo exterior, permitindo que este, diluído ou como diz , “dissolvido” e desfocado na distância do horizonte, se torne visível na nitidez do poema que o pretende “empequenar” – eu diria “concentrar” ou "focar", permitindo assim observá-lo com uma nitidez e uma proximidade que transmite apoio e segurança ao “poeta”, o qual precisamente tentou fazer o poema por necessidade desse apoio e segurança.

Caro Atalp, um comentário como este seu, vale por muitos milhares de posts principais em milhares de blogs que por aí proliferam. Ou seja… é um comentário de… mais que Prata, Ouro!

Creio que com esta resposta consegui estabelecer uma magnífica Plataforma de Reflexão consigo.

Volte quando lhe apetecer reflectir... ou apenas opinar.
Quem sabe se um dia não se publicará um livro de título "Reflexões entre Dois Reflexos" ?
:)

sábado, 14 de abril de 2007

ponte



perdi rumo perdi norte
perdi noites madrugadas
perdi os lances de sorte
perdi as boas jogadas

procurei fazer a ponte
entre dois desconhecidos
subi ao cimo do monte
mas foram passos perdidos

perdi-te sem te encontrar
procuraste outro horizonte
e o rio não pode passar
debaixo da mesma ponte

domingo, 8 de abril de 2007

AmArte

O Artista comovido perante a grandiosidade das Obras antigas
(Fussli)

Amo-te Arte, Deusa, Mãe, Mulher
que iluminas as trevas da humana mente.
Amo-te Arte e não sou sequer
digno de olhar teu rosto resplendente.

De rastos a teus pés sigo como um mendigo
a quem negaram o pão de uma bela pintura.
Debaixo do teu manto procuro um puro abrigo
onde ouça sinfonias quebrando a noite escura.

Arte... sê minha e faz-me teu, antes da sepultura.

Robert 9/4/07

sábado, 7 de abril de 2007

Dado o superavit de Coelhos nesta Quadra...

... para variar, convidei o Gato Pasc(o)al para vos desejar,
incluindo Famílias e Bicharada vária...

UMA PÁSCOA FELIZ !!!

(Aiiii... ainda me vão acusar de vender gato por lebre...)

sexta-feira, 30 de março de 2007

solo



Esta insónia intermitente
entre o sonho e o pesadelo

Os meus lábios entreabertos
teu nome breve em apelo

Os meus dedos intangíveis
perdidos no teu cabelo

Este total desconcerto
do teu corpo inconsistente
entre os meus braços desertos

Tua boca, fruto ausente
que desejo incoerente
sobre o meu corpo desperto

Sou praia de branca areia
sou rio da sede que anseia
ser foz da tua nascente

Este amor é para dois...
assim, solitariamente,
sem ter antes nem depois,
é quimera inconsequente...
é ave de asa partida
que não sobe ao transcendente...
é semente destruída,
é simulacro de vida,
é morte em forma diferente.

domingo, 25 de março de 2007

menina primavera


Primavera pequenina
dos meus sonhos cor de esperança
com flores na tua trança
foste, rosada menina,
o meu amor de criança!

Corríamos campos fora
eu era o teu cavaleiro
eu era sempre o primeiro
fui desde a primeira hora
o teu amor verdadeiro!

Hoje perdida no tempo
vives na recordação...
pequenina Primavera
não sou o menino que era
mas estás no meu coração!

quarta-feira, 21 de março de 2007

DIA DA POESIA

Quadros de Lucebert

MEU POEMA

sou o fantasma holofote
instalado em nicho escuro
- 'aqui há gato' -
sussurra a jóia surripiada
ofuscada por mim ao voltar da festa

sou um espantalho sou olhado
no ovo recheado da minha dor
e a ave que deixa o filhote
espatifar-se no chão (é a sua espécie)
nasce com olhos meigos

sou o grande caos após o incêndio
sou o mobiliário gotejante
que ainda fumega e sou o torcer de mãos
o beber aguardente na noite húmida
sou a constipação após o grande incêndio

sou o tirano pálido na manhã alva
o seu relógio vai atrasado
mas o coração antecipa a sentença de morte
e uivo ao cheiro de carne humana
embora não goze tal delícia há anos

sou a rapariga que na minha memória
encontro na colina florida
converso com ela tão meigamente
como a brisa estival fala ao convalescente
ela é muito pálida e tem rosto de memória

sou a voz que não dá voz
ao que já tem voz
mas que sobre o silêncio angustioso
coloca a imagem miraculosa de uma palavra
e só depois alheio a todo o medo
se sabe o que eu quis dizer com tudo isto
o Poema é amuleto

LUCEBERT (pseudónimo de L. J. Swaanswijk, Holanda, 1924-1994) é a incarnação do espírito cinquentista: exuberante, agressivo, rebelde. Tanto na sua obra plástica, como na de poeta, é manifesto o seu desprezo por dogmas e convenções artísticas e sociais. Busca a inspiração na arte primitiva (o tema do negro), na ingenuidade (tema da criança), na espontaneidade, na atonalidade, do que resulta uma arte sumamente revolucionária, livre, mas ao mesmo tempo estruturada pelo intuito de restituir ao homem as forças elementares, perdidas ou recalcadas na civilização ocidental.
Pelo seu olhar desprevenido, que considera as coisas sem situá-las em qualquer sistema, pela absoluta liberdade de associações de imagens, pelo emprego de metáforas, símbolos e mitos, pela formação de neologismos e pela desintegração da sintaxe, Lucebert é, à primeira leitura, um dos mais difíceis poetas holandeses modernos.

(Tradução do Poema: August Willemsen e Egito Gonçalves)

segunda-feira, 19 de março de 2007

dia do Pai ausente


O Filho:

Pai, outro dia que passamos
tu sem mim e eu sem ti
tão distantes que nós estamos
mas estás aqui... e eu aí.

O Pai:

Eu não consigo encontrar-me
tu andas só e perdido
mas continuas a amar-me
e eu a ti... meu Filho querido.

sexta-feira, 9 de março de 2007

distância



Procuro-te no resto do meu sonho
que ficou parado clandestino
quando com o teu olhar quase tristonho
me pediste que voltasse a ser menino


Ansiosamente procuro o que restou
dos brinquedos perdidos de uma infância
parti cedo demais e o que não sou
cabe na tua mão cheia de distância

domingo, 25 de fevereiro de 2007

sem regresso



Larguei a tua mão cedo demais
Perdi-me num caminho sem regresso
E para não te ouvir gritar "Já vais?"
Virei a vida toda pelo avesso.


Perdido na saudade tu ficaste
Tentando ouvir-me a voz em cada esquina
Mas cada dia mais longe te afastaste
Perdida da minha mão a tua mão franzina.

sábado, 24 de fevereiro de 2007

faltou-nos o tempo


para corrermos pelos campos fora

para nos abraçarmos tontos da canseira

para cantarmos à volta da fogueira

para nos deitarmos tarde, sem ter hora


para te contar todas as velhas histórias

que meu avô um dia me contou

para te deixar de presente as memórias

que trazia dentro daquilo que não sou


ficaste criança no tempo à minha espera

buscaste na noite o perfume de mim

deixaste lágrimas correr de uma quimera

nasceste no princípio do meu próprio fim

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

se não for tarde demais



quero dizer-te ainda as palavras
que me ficaram presas na garganta

quero contar-te dos meus sonhos breves
se ainda a minha voz no teu coração canta

será que ainda podes comigo percorrer
as areias da praia onde te vi crescer

será que posso dar-te ainda a mão
e não te deixar mais sem norte e sem razão

se for tarde demais, diz-me que vá embora
mas se ainda me esperas, perdoa-me a demora